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Comportamento / O que é capacitismo?

Capacitismo: Por que pessoas com deficiência não são necessariamente guerreiras ou exemplos de superação?

A modelo e atriz Maria Paula Vieira explica o que é capacitismo e como este preconceito age na sociedade

Ivana Guimarães Publicado em 25/08/2020, às 13h40

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A modelo e atriz Maria Paula Vieira dona do instagram @maaria_vieira - Instagram
A modelo e atriz Maria Paula Vieira dona do instagram @maaria_vieira - Instagram

Você já chamou pessoas com deficiência de guerreiras, ou exemplos de superação, só por elas existirem? Você sabia que isso é uma forma de capacitismo?

A modelo Maria Paula Vieira, que cria conteúdos na sua conta de Instagram @maaria_vieira e compartilha experiências como uma mulher cadeirante, explicou o que é esse preconceito e como ele age na sociedade.

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A sociedade coloca obstáculos pra mim e depois vem me chamar de exemplo de superação. ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ Separa o lenço, veja essas histórias que são verdadeiros exemplos de superação! Frases como essa são ditas todo o tempo na mídia, em reportagens, colunas, mostrando a vida de uma pessoa com deficiência. O que pode parecer um elogio, forma de carinho, na verdade é um preconceito disfarçado! Isso parte do pensamento⠀que pessoas com deficiência são inferiores e não enxergam que temos as mesmas capacidades, dons, habilidades. Não nos olham como iguais quando nos colocam como super, como guerreiros. Isso fica mais evidente porque geralmente não é por fazermos grandes feitos, muitas vezes as pessoas nem conhecem a gente de fato, mas simplesmente por levarmos uma vida normal como qualquer pessoa e fazer o que todo mundo faz como trabalhar, estudar ou simplesmente estar na rua. Qual o exemplo disso? Não é o que você faz todo dia também, o que todos fazem? Além disso, nos ter como exemplos de superação mostra a necessidade de se sentir melhor com a própria vida, para reclamar menos, um coitadismo enraizado que mostra a necessidade de afirmar que nossa vida deveria ser ruim e deveríamos estar no quarto chorando...”você é um exemplo pra mim, um guerreiro” e por dentro “graças a Deus que eu não passo por isso”.⠀Percebe o quão cruel pode ser? Eu fico triste quando ouço isso, porque sei a sua origem. Sei que não me veem capaz. Eu não quero inspirar ninguém dessa forma,⠀por simplesmente existir, nem minha função social é essa. Se eu passo por obstáculos em decorrência da falta de acessibilidade, estruturas, é culpa da sociedade que não acha que eu deveria estar levando uma vida normal e depois vem me chamar de exemplo de superação! ⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀⠀ Foto: @_mayararios #pratodosverem uma foto de Maria de costas em um parque, muito verde ao seu redor. Na cadeira de rodas que está sentada tem uma borboleta branca.

Uma publicação compartilhada por Maria Paula Vieira (@maaria_vieira) em

“O capacitismo é qualquer discriminação voltada à pessoa com deficiência. Os preconceitos afetam as minorias assim que elas saem de casa. A mulher sai sabendo que uma sociedade machista vai oprimi-la. Um negro, com receio das ofensas que pode sofrer. Um casal homossexual, com medo da homofobia. E o mesmo vale para as pessoas com deficiência. Vamos para a rua sabendo o quanto o capacitismo vai nos afetar. Seja na falta de acessibilidade em ambientes que excluem nossa existência. Em atitudes discriminatórias como os olhares invasivos que nos atravessam. Na dúvida a respeito de nossas capacidades, nos inferiorizando ou infantilizando. E também naquela discriminação disfarçada de elogio, como “você é tão bonita, nem parece deficiente” ou “quando eu penso em reclamar, vejo você aí”, entre tantas situações”, afirmou a criadora de conteúdo.  

Em casos recentes como nas ofensas racistas que o entregador Matheus Pires recebeu, houve tentativas de justificar o crime alegando que o agressor sofria de doença mental. Maria explicou que isso é uma forma dolorosa de capacitismo: “A sociedade usa o argumento da doença mental por acreditar que alguém nestas condições não deve estar nela, e isso é algo que está enraizado e vem do passado, quando de fato trancavam esses indivíduos nos conhecidos manicômios sem chance de socialização. Ainda se tem a visão negativa de que uma pessoa com deficiência intelectual é agressiva, incontrolável e não deve estar em convívio por não possuir noção ou discernimento de qualquer coisa. Sendo que pessoas com qualquer deficiência podem ter autonomia, uma vida ativa, estudar, trabalhar, como todos."

"É capacitismo porque associam atos criminosos e desvios de caráter a nós. E isso é algo frequente, como por exemplo xingar alguém de “retardado”, como se ter uma deficiência fosse ofensa. Muitas vezes se luta contra um preconceito, cometendo outro", continuou a modelo.

E de que forma quem não tem algum tipo de deficiência pode colaborar na luta anticapacitista? "Todos precisam se perguntar se dentro dos meios que estão há pessoas com deficiências. No trabalho, faculdade e até na mesa do bar. Se não, onde elas estão? Por que não estão nesses espaços? A partir disso, é necessário querer mudar, consumir conteúdo e nos contratar. Questionar se há projetos de bolsas dentro da sua universidade, convidar aquela pessoa com deficiência que você sempre vê e ignora pra tomar uma cerveja. É preciso ouvir e entender nossas demandas. Além de cobrar que os espaços sejam acessíveis para que todos tenham autonomia", recomendou Maria Paula.

"A sociedade precisa entender que todos merecem respeito e que existe um mundo muito diverso, com corpos diferentes. Além disso, o que falta é perceber que existem atitudes que nos excluem, então é necessário desenvolver projetos que promovam inclusão, buscar informações, nos enxergar como humanos. Não somos um exemplo de superação, nem coitadinhos, somos humanos que têm que ter seus direitos garantidos", esclareceu ela.

Maria Paula Vieira é fotógrafa, jornalista, atriz e modelo. Em sua conta no Instagram @maaria_vieira ela compartilha conteúdos sobre representatividade e inclusão.