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Comportamento / Literatura

Imperfeitas e apaixonadas: Giulianna Domingues lança livro sobre romance de duas mulheres

A autora bateu um papo exclusivo com a Máxima Digital e falou sobre 'Luzes do Norte', preconceito e deu um 'spoiler' sobre seu próximo projeto

Gabriele Salyna Publicado em 19/04/2021, às 16h32

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Giulianna Domingues lança livro com temática LGBTQIA+ - Instagram
Giulianna Domingues lança livro com temática LGBTQIA+ - Instagram

Giulianna Domingues é uma artista! A autora possui uma sensibilidade aflorada pelas experiências que já viveu em sua vida pessoal.

Feminista e bissexual, a escritora sentiu a necessidade de ter histórias com temáticas LGBTQIA+ no universo dos livros.

Pensando nisso, Giulianna lançou Luzes do Norte, uma trama ficcional e fantasiosa que conta o romance entre Dimitria e Aurora, duas mulheres completamente diferentes. 

Para compor seu livro, a autora se inspirou e trouxe uma releitura do famoso mito do lobisomem. 

Convidamos Giulianna para um bate-papo exclusivo com a Máxima Digital para sabermos tudo sobre "Luzes do Norte", vida pessoal, preconceito e planos futuros. 

MÁXIMA DIGITAL: Você lançou “Luzes do Norte”, conta um pouquinho para a gente sobre o processo?

GIULIANNA DOMINGUES:Claro! Tudo começou com um "não" - na verdade vários "nãos", que eu recebi de editores e agentes literários ao longo de 2020. Eu tinha trabalhado Luzes do Norte por bastante tempo, achava que estava na hora de ele ver o mundo e inicialmente procurei o mercado da maneira tradicional. Foi aí que eu bati em algumas traves: pessoas elogiaram a minha escrita, mas no geral bastante gente me disse que fantasia era difícil de emplacar no Brasil e que portanto não tinha espaço pra Luzes. 

Ainda assim, sou uma leitora assídua de fantasia e meu instinto dizia que eu tinha que confiar na minha história. Como trabalho com marketing, sabia que tinha conhecimento pra fazer esse lançamento. Eu encarei esse projeto como se fosse a minha própria editora, analista financeira, designer… Passei três meses montando a estratégia e investindo o que podia pro lançamento ser um sucesso. Contratei uma capista incrível - a artista Taíssa Maia - para dar vida ao produto Luzes do Norte, engajei vários influenciadores. Foi um projeto completo.

Importante dizer que eu só pude fazer isso por causa de vários privilégios: eu sou uma mulher branca, moro nos Estados Unidos e pude guardar dinheiro e tempo pra fazer isso.

Só fui perceber que tinha dado certo quando nas primeiras 24 horas da pré-venda Luzes vendeu mais de 100 cópias, ficando no topo dos rankings da Amazon e superando até livros que eram minhas referências de infância. Hoje já são 460 cópias vendidas e tem sido muito gratificante. Me mostrou que meu sonho valeu a pena.

MÁXIMA: Você acha que é importante essa representatividade LBGTQIA+ na literatura?

GIULIANNA:Não só importante: acho que é o primeiro passo pra contar histórias cada vez mais abrangentes e normalizar a narrativa de uma coisa que é normal. Acho inclusive muito importante expandir essa representatividade: não só que a gente consuma histórias com personagens LGBTQIA+, mas de pessoas LGBTQIA+, pessoas não-brancas, pessoas com deficiência, enfim, que trazem narrativas e vivências diversas.

Eu cresci vendo filmes da Disney dos anos 90, em que sempre tem um príncipe que fica com a princesa. Se eu não tivesse visto histórias que vão além disso, como saberia que isso é possível? Como me entenderia como mulher bissexual? E isso vale pra diversos tipos de representatividade. O que importa não é só a presença dessa representatividade, mas o fato de que pessoas LGBTQIA+ podem viver aventuras, fazer magia e se apaixonar sem que sua identidade seja o ponto da história. Nós somos iguais a todo mundo.

MÁXIMA: Como foi o processo de criação da história?

GIULIANNA:Em 2017 eu visitei o Alasca em uma viagem com a minha mãe para ver a aurora boreal. Foi uma das coisas mais incríveis que eu já vi, e eu só conseguia pensar que aquelas luzes eram feitas de magia. Eu me peguei pensando em como a lua é um elemento mágico, por exemplo na lenda do lobisomem ela transforma pessoas em lobos… E isso me levou à ideia de que a aurora boreal também teria esse poder transformador.

A partir daí, eu sabia que queria centrar a história em um casal de mulheres - como disse, amo fantasia, e não é tão comum ver livros de fantasia com casais sáficos ou lésbicos. Foi assim que Luzes do Norte nasceu.

Escrevi a primeira versão de Luzes ao longo de alguns meses e depois ele passou por um longo processo editorial que foi o que transformou a história em livro. Tem uma frase famosa que diz "escrever é reescrever", e isso foi muito verdade em Luzes. Eu contratei profissionais que fizeram leituras críticas para ajudar a montar a estrutura da história, trabalhei com leitores beta para entender onde precisava mudar, conversei com o meu mentor de escrita - o escritor Fábio Barreto, que publicou Snowglobe em 2019 - sobre a linguagem… Escrita é um trabalho solitário de primeira, mas existe uma comunidade de pessoas que me ajudou no processo de Luzes do Norte.

E todo esse processo foi feito com muita vontade de honrar aquela ideia inicial, aquele pedaço de magia que eu tinha sentido no Alasca.

MÁXIMA: Você já deu de cara com o preconceito por ser bissexual? Como você vê essa situação?

GIULIANA: Minha existência é definida por vários privilégios que me garantem proteção, mas acho que a primeira vez que eu beijei uma mulher em público foi quando eu senti que essa parte da minha identidade não era bem-vinda em todos os lugares, infelizmente. Além disso, eu sou uma mulher bissexual que está em um relacionamento hétero há bastante tempo, e, por isso, eu sempre senti que não tinha direito de ocupar um espaço nesse sentido - como se eu não fosse bissexual o suficiente, sabe? Foi um processo longo até eu sentir que podia reclamar essa parte da minha identidade.

MÁXIMA: Muitas meninas e meninos podem se inspirar em você. Como você se vê sendo um exemplo para essas pessoas?

GIULIANNA:Eu enxergo isso com muita ansiedade, pra ser sincera! Meu objetivo é contar as minhas histórias e quando as pessoas se identificam com elas, isso é incrível. Mas eu gosto de ser responsável com a comunidade de leitores que eu estou criando: eu sou uma pessoa falha, que erra e se esforça para aprender. Como eu disse, eu carrego muitos privilégios - de raça, de classe, de cisgeneridade - e isso faz com que eu tenha pontos cegos. Então eu vejo uma responsabilidade muito grande da minha parte de continuar me educando, aprendendo e ouvindo críticas, além de entender que minha voz - apesar de única e especial - é uma só, e que a medida que minha comunidade crescer eu preciso levantar outras vozes. Especialmente vozes que são contrapontos à minha cegueira. 

MÁXIMA: Como você enxerga que esse seu projeto contribuirá para a comunidade LGBTQIA+?

GIULIANNA:Eu espero que Luzes do Norte inspire mais pessoas a escreverem histórias sobre pessoas LGBTQIA+ sendo mágicas, usando espadas e arco e flecha, se transformando em ursos polares… Nós somos muito mais do que a nossa identidade, sabe? Ela é só um aspecto - importante, mas pequeno - do que a gente tem a oferecer para o mundo e do tipo de histórias que podemos contar. 

Eu nem ao menos acho que deveria existir essa categoria, literatura LGBTQIA+. Afinal, nós estamos tratando de temas universais: descoberta de si mesmo, amar e ser correspondido (ou não), etc. 

MÁXIMA: Quais seus próximos planos? Já temos algum ‘spoiler’?

GIULIANNA:Meu maior plano é continuar escrevendo. Eu tenho muita fome e muita ambição, meu marido frequentemente usa a frase do musical Hamilton pra me perguntar "por quê eu escrevo como se meu tempo estivesse acabando?". Um spoiler que posso dar sobre meu próximo projeto é que ele é também é uma fantasia, mas bem diferente de Luzes do Norte - é mais ou menos um encontro de The Office com contos de fada, e a personagem principal é uma Fada Madrinha carreirista. Uma coisa é certa: de onde veio Luzes do Norte tem muito, muito mais!

Giulianna Domingues e seu livro "Luzes da Noite"
Divulgação