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Comportamento / Empoderamento feminino

"Nós, mulheres, precisamos lutar todos os dias", afirma Gizelly Bicalho; conheça a trajetória inspiradora e empoderada da advogada criminalista

A ex-BBB, advogada criminalista e verdadeiro FURACÃO revelou detalhes de sua carreira em um ambiente machista e reforçou sua luta diária pelos direitos das mulheres

Marina Scherer Pastorelli Publicado em 15/01/2021, às 18h40

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"Se a advocacia não está preparada pra isso, ela que lute, porque ela TEM que me aceitar", afirma, Gizelly Bicalho ao citar conceitos machistas contidos em sua profissão até hoje - Instagram/ @gizellybicalho
"Se a advocacia não está preparada pra isso, ela que lute, porque ela TEM que me aceitar", afirma, Gizelly Bicalho ao citar conceitos machistas contidos em sua profissão até hoje - Instagram/ @gizellybicalho

Furacão de mulher, advogada criminalista, empoderada, justa, dedicada e feminista: vamos falar de Gizelly Bicalho?

Quem associa esse nome apenas ao BBB20, realmente não conhece nem um pouco da trajetória inspiradora que esse mulherão teve.

"As coisas nunca foram fáceis. Até para vir ao mundo, eu tive que enfrentar a vontade do meu pai de me abortar. Minha mãe que insistiu e disse que ia ter o bebê. Depois disso, minha vida toda foi assim: meu pai batendo na minha mãe, comigo na barriga dela; depois minha mãe ficou viúva quando eu tinha 6 anos e eu tive que amadurecer muito rápido", conta Gizelly, aos 29 anos.

E assim aconteceu. Batalhadora, morando em Piaçu, distrito do Espírito Santo que possui cerca de 6,5 mil habitantes atualmente, a morena cresceu, amadureceu e enfrentou diversos desafios para chegar aonde sempre desejou.

"Desde pequena, quando me perguntavam o que eu ia ser quando crescer, eu dizia que ia aparecer na televisão. Eu sempre gostei dessa coisa de falar, comunicar… Quando fui crescendo em Piaçu, fui vendo que não ia ser muito fácil. Não tinha oportunidade, não tinha nada. E eu sempre falava assim pra minha avó: ‘Quando eu pisar na calçada da Globo, eu nunca mais vou sair de lá’. E minha avó devia pensar: ‘Tadinha dessa menina, vai entrar na Globo como, morando nessa roça?’". Sim. Ela pisou na Globo morando na roça.

Mas antes disso, muita coisa aconteceu!

Com o exemplo da mãe, que trabalhava com a mão na massa na roça -- com tarefas majoritariamente masculinas, ela não se acanhou na hora de optar por fazer uma faculdade desafiadora para muitas mulheres: Direito.

"Com o tempo [após passar no vestibular], fui percebendo que ser advogada é a profissão mais linda que existe no mundo, porque você defende o direito e a garantia de outra pessoa. Mas, infelizmente, essa é uma profissão desvalorizada pela sociedade. E meu primeiro estágio foi em uma delegacia, então eu via como os advogados eram tratados e via como ele sofriam todos os dias" .

Entretanto, uma coisa é ser advogado homem, outra é ser uma advogadA.

"Abri meu próprio escritório e fui ralando sozinha. Porém, temos um problema na advocacia. Nós vivemos em uma sociedade machista, a advocacia é patriarcal e a advocacia criminal é formada por homens, na maioria. Aqui no Espírito Santo temos muitas mulheres também, SIM, mas os homens são maioria [...] Passei por todos os tipos de desrespeito na minha profissão, que você possa imaginar. De juízas não me respeitando por ser jovem, por ser esteticamente bonita…", lembra.

Durante a conversa, Gizelly Bicalho comenta um episódio extremamente machista que a marcou após um Tribunal de Júri que fez ao lado de um grande advogado do Brasil.

"Eu fiz um Júri com um advogado que era muito famoso e nessa época tinha um grupo de todos os criminalistas do Brasil no WhatsApp. Nisso, quando o advogado mandou uma foto com a gente de beca, após termos concluído tudo, outro profissional mandou uma foto minha de biquíni, logo em seguida na conversa". 

PROFISSIONALISMO X LAZER: não confunda os termos

A foto pela qual Gizelly foi exposta para os colegas de trabalho, não mostrava a advogada em exercício da profissão. Representava um de seus momentos de lazer, porque, como qualquer outra pessoa, ela é humana e sempre teve o direito de aproveitar o tempo livre na praia, com amigos, com família... Mas por que em pleno século XXI, essa discussão de "para ser alguém de respeito não pode publicar fotos de biquíni nas redes sociais" ainda existe?

"O tanto de esporro que eu já tomei de advogados mais velhos, que diziam que eu nunca seria uma advogada de destaque, porque advogados não podem postar isso… Não está escrito no código de ética que no meu Instagram, que está escrito GIZELLY BICALHO e que mostra a minha vida, eu não posso postar. Não está escrito isso em nenhuma lei da Constituição. Mas existe uma lei que machuca e mata todos os dias, que chama machismo. Mulheres morrem por conta disso".

"Eu sou uma jovem de 29 anos que é LIVRE. Eu sempre falei que meu Instagram é de uma mulher livre. E outra coisa eu sempre disse: ‘Se a advocacia não está preparada pra isso, ela que lute, porque ela TEM que me aceitar’. Se o promotor, o juiz, a juíza não aceitam uma advogada assim, eles que me perdoem. Me desculpem, mas eles são do século XXI e terão que engolir goela abaixo tudo isso. Eu sei da minha capacidade intelectual. Para ser advogada, eu precisava andar 24h de terninho, no calor de 40ºC de Vitória (ES), todos os dias? Não! No sábado, a Gizelly colocava o shortinhos e o chinelo dela e ia tomar uma cerveja com os amigos dela, ia para a praia. Eu sou assim!".

LUTA CONSTANTE PELOS DIREITOS DAS MULHERES

Gizelly Bicalho ficou conhecida por sua participação no Big Brother Brasil 20, com seus altos e baixos, seu jeito carismático e sincero de enfrentar as situações, mas ao sair do reality algo que ela demonstrou fortemente foi que aproveitaria sua exposição de nível nacional para defender a luta pelos direitos das mulheres -- visto que já tinha enfrentado todos os tipos de machismo, desde um relacionamento abusivo até sua própria profissão. 

"Eu vivia dentro da minha casa com meu pai agredindo a minha mãe todos os dias por conta do machismo e minha missão na terra é lutar contra o machismo, empoderar as mulheres, falar e mostrar que nosso corpo é livre. Nós, mulheres, somos livres e que minha capacidade intelectual não é ligada à minha vida pessoal".

"Minha luta continua. Nós, mulheres, precisamos lutar todos os dias. Em 2019, quando eu advogava, eu sempre dizia: ‘a mulher já nasce lutando contra o machismo. Os advogados já lutam todos os dias, naturalmente, na profissão. Agora, ser mulher, advogada, jovem e criminalista… Esquece! É todos os dias você acordar pra ir pra guerra. É todos os dias ouvir alguém te desrespeitando, te olhando… Algumas pessoas acham que o machismo está na Classe C da sociedade, mas não está! Machismo é você chegar em um Tribunal de Justiça, com um desembargador, e conversar com ele, vendo que ele está olhando para o seu peito. É o desembargador olhando para sua bunda ou para a sua cara, debochando. Para ser mulher, você precisa ser três vezes mais que o homem. Fazer mais, provar mais [...] Já ouvi frase que ‘para ser criminalista, você precisa falar grosso, bater na mesa, ter bigode e cabelo no peito’. Eu falei: ‘Rapaz, a única coisa que eu não tenho é cabelo no peito, porque o resto eu faço tudo’".

Acumulando mais de 5 milhões de seguidores nas redes sociais, a advogada tem tocado alguns projetos em prol das mulheres. Um deles é o Sentinelas (junto com Marcela Mc Gowan e Izabella Borges). Outro, mostrado recentemente em seu canal do Youtube, é um projeto de doação de livros para um presídio, focando na educação de todos - pilar que considera tão importante para a sociedade.

"Eu, como operadora do Direito, já fiz várias críticas ao estado do Espírito Santo, só que não adianta só criticar. Quando cheguei aqui, pensei: ‘O que posso fazer aqui para ajudar, agora que tenho visibilidade?’ Eu já tinha feito algumas doações de livro antes do BBB, mas eram livros que eu pedia na academia, para as pessoas, amigos. Mas agora pude usar o Instagram para isso. Fiz duas entregas bem grandes, com uns mil livros, porque não quero SÓ falar, quero fazer. Não quero só criticar, quero agir".

METAS PROFISSIONAIS

E para finalizar, a dúvida que não quer calar: perguntamos como a Gizelly se vê daqui pra frente? Como advogada? Comunicadora? 

"Eu sou advogada e não deixarei de ser, porque eu estudei 10 anos para isso e amo falar sobre Direito. Acho até que nossa sociedade deveria ter uma matéria na escola de Direitos Básicos, pra todos aprenderem a cobrar seus direitos. E eu quero continuar na advocacia, mas talvez de uma forma macro. Com palestras, cursos, informando pessoas… E a comunicação é algo que eu amo e esse ano quero aliar à a advocacia. Além disso, vou continuar trabalhando com o meu Instagram. Quero juntar o que eu já fazia antes, com filantropia, por exemplo, e aliar isso à minha visibilidade".

Sucesso, Gizelly! Obrigada por tanto!